Quando ele me chamou de mãe

Há quem diga que quando adotamos uma criança maior, perdemos o privilégio de viver os “primeiros momentos” de um serzinho bem especial. Que esses marcos — como as primeiras palavras, os primeiros passos ou o primeiro “mãe” — são exclusivos da maternidade biológica ou da adoção de bebês. Mas digo, com todo o amor e com a vivência de quem está nessa estrada há três anos eu digo: isso não é verdade.
Meu filho chegou até nós com quase oito anos. Hoje, tem onze. E, ao contrário do que muitos pensam, a nossa vida é repleta de primeiras vezes. Talvez diferentes daquelas que idealizamos, mas não menos emocionantes. Não ouvi ele me chamar de “mãe” pela primeira vez — na verdade, ele nunca me chamou de mãe, e talvez nunca chame. E tudo bem. Porque o vínculo que construímos vai muito além das palavras.
Desde que ele chegou já vivemos muitas primeiras vezes.
Lembro-me da primeira vez que fomos ao shopping. Ele experimentou chocolates com frutas — algo tão comum para muitos — mas inédito para ele. Suas expressões de descoberta e encantamento ainda vivem na minha memória. Foi como presenciar um novo mundo se abrindo diante dos nossos olhos.
Lembro da primeira vez que ele conseguiu dizer “Amarelo” direito. É o nome do nosso cachorro, e ele sempre falava “Amalelo”. Quando conseguiu pronunciar corretamente, eu chorei. Parece bobo para quem vê de fora, mas é uma dessas conquistas invisíveis que carregam muito esforço, paciência e afeto.
E como esquecer o dia em que tirou nota 8 em matemática, sem ajuda de ninguém? As professoras vibraram, eu vibrei, e ele — ah, ele — sorriu com um orgulho tímido e sincero. Aquela nota foi mais do que um número. Foi superação. Foi vínculo. Foi amor.
Somos família há três anos. Não foi fácil, e ainda não é. A adaptação é um processo, às vezes lento, às vezes dolorido, mas sempre possível quando há entrega verdadeira. Ainda temos muito a percorrer, muito a aprender juntos — mas cada passo tem valido a pena.
Adoção tardia é amor que aprende, que constrói e reconstrói. Não é ausência de primeiras vezes. É um convite para enxergar que a vida, em sua simplicidade, nos oferece novas estreias todos os dias. Basta estar presente, com o coração aberto, para reconhecê-las.
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