Quando ele me chamou de mãe

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Sou mãe de um menino de onze anos. Meu menino. Esperto, lindo e cheio de vida. Mas ele carrega nos ombros uma bagagem que não pertence a nenhuma criança. Uma bagagem que o tempo, a fome, a ausência e a solidão colocaram sobre ele. Ele sabe o que é sentir fome. Sabe o que é não ser cuidado. Sabe o que é andar sozinho por aí, indefeso, tendo apenas a si mesmo. Antes de chegar à minha vida pela adoção, ele viveu capítulos que eu daria tudo para reescrever. E talvez por isso, até hoje, tenha dificuldade de me chamar de “mãe”. Essa palavra parece morar numa prateleira alta demais, inalcançável para ele. Mas na madrugada de sábado para domingo, algo aconteceu. Ele estava com febre. Dormia inquieto, murmurando palavras que vinham de algum lugar entre sonho e delírio. Eu estava ali, ao lado dele, cuidando, sentindo sua respiração quente, atenta a cada movimento. E então… aconteceu. Ele me chamou de Mãe . Foi só uma vez. Baixinho. Quase como se fosse para si mesmo. E naquele instante, o ...

Quando Preciso Ser a Cruela para Ensinar Meu Filho a Dormir Sozinho

Sono

O peso invisível de ser sempre a presença acolhedora

Nem sempre é fácil ser a mãe amorosa, paciente e compreensiva que desejamos ser. Às vezes, para proteger o nosso filho — e a nós mesmas —, precisamos tomar decisões difíceis. E em alguns desses momentos, nos sentimos como vilãs de um conto que só nós sabemos como termina.

Essa semana, por exemplo, me senti a própria Cruela DeVil. Tudo porque disse “não” ao meu filho. Um não cheio de amor, de exaustão e de medo.


Ele tem onze anos, mas o tempo dele é outro

Meu filho tem onze anos, mas, por conta de um atraso cognitivo, vive o mundo com a leveza (e a dependência) de uma criança mais nova. Ele dorme bem apenas quando está colado em mim — como se minha presença fosse um cobertor que o protege da noite.

Naquela noite específica, ele quis ficar acordado com o pai até mais tarde. E eu, exausta, fui dormir antes. Horas depois, fui acordada porque ele queria que eu o colocasse para dormir. Disse que ele poderia deitar perto de mim, mas não foi o suficiente. Ele queria que eu estivesse na cama dele, ao lado dele. E eu... eu só queria dormir um pouco mais. Precisava acordar cedo. Precisava de mim.


Amor com limites também é amor

Expliquei com cuidado que ele precisava tentar dormir sozinho. Que o pai estava ao lado dele, e que aquilo bastava. Mas ele chorou. Chorou muito. E, com o coração despedaçado, eu me mantive firme.

E foi nesse momento que me senti cruel. Mas não porque fiz algo errado. E sim porque nós, mães, somos treinadas a nos sentirmos culpadas por qualquer coisa que não seja doação completa.

A verdade é que eu também sou gente. E estou aprendendo, dia após dia, que colocar limites não é falta de amor. É justamente porque amo que preciso ensinar a ele que o mundo nem sempre vai funcionar no ritmo que ele quer — e que nem sempre eu estarei disponível.


Quando o coração aperta e a culpa bate

Depois que ele adormeceu, fiquei ali no escuro, acordada, tentando me convencer de que tinha feito o certo. E sei que fiz. Mas isso não impede que a culpa tente fazer morada. Afinal, é um desafio gigante equilibrar o amor, o cuidado e a necessidade de ensinar autonomia.

Se você, mãe que lê este texto, já viveu algo parecido, quero te dizer: você não está sozinha.


A maternidade real também é feita de nãos

Nem todo dia conseguimos ser doces e tranquilas. Às vezes, educar exige força, exige firmeza — e exige colocar o próprio cansaço como prioridade, sem culpa.

A maternidade real não é feita de perfeição. É feita de escolhas difíceis, de noites mal dormidas, de decisões que doem no peito. Mas também é feita de amor. Um amor que ensina, que prepara, que sustenta.

Então, da próxima vez que você se sentir a "vilã" da história por não ceder, lembre-se: talvez você só esteja sendo a heroína que o seu filho realmente precisa.

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