Quando ele me chamou de mãe

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Sou mãe de um menino de onze anos. Meu menino. Esperto, lindo e cheio de vida. Mas ele carrega nos ombros uma bagagem que não pertence a nenhuma criança. Uma bagagem que o tempo, a fome, a ausência e a solidão colocaram sobre ele. Ele sabe o que é sentir fome. Sabe o que é não ser cuidado. Sabe o que é andar sozinho por aí, indefeso, tendo apenas a si mesmo. Antes de chegar à minha vida pela adoção, ele viveu capítulos que eu daria tudo para reescrever. E talvez por isso, até hoje, tenha dificuldade de me chamar de “mãe”. Essa palavra parece morar numa prateleira alta demais, inalcançável para ele. Mas na madrugada de sábado para domingo, algo aconteceu. Ele estava com febre. Dormia inquieto, murmurando palavras que vinham de algum lugar entre sonho e delírio. Eu estava ali, ao lado dele, cuidando, sentindo sua respiração quente, atenta a cada movimento. E então… aconteceu. Ele me chamou de Mãe . Foi só uma vez. Baixinho. Quase como se fosse para si mesmo. E naquele instante, o ...

A mudança de sobrenome na adoção: como foi viver esse processo com meu filho

Sobrenome

A maternidade me encontrou através de um caminho especial: a adoção. Seguindo todos os trâmites legais, construímos juntos nossa convivência, nosso amor e nossa família. Um dos momentos mais simbólicos do processo de adoção é quando a criança recebe sua nova certidão de nascimento, já com o sobrenome da nova família. Parece um marco alegre — e para muitos é. Mas, para o meu filho, a realidade foi bem diferente.


A notícia da mudança de sobrenome

Quando comecei a explicar ao meu filho que, ao final do processo, ele teria seu sobrenome modificado, me deparei com algo que eu não esperava: confusão e medo.
Ele deixaria de ter o sobrenome da família de origem para carregar o meu e o do meu marido. Embora para nós isso significasse pertencimento e continuidade, para ele era como apagar parte de sua história.

Todas as vezes que eu tentava retomar o assunto e explicar a importância dessa mudança, ele se agitava, mudava de assunto e mostrava desconforto. A sua reação me fez perceber que, naquele momento, insistir poderia gerar ainda mais ansiedade e dor.


A importância do acolhimento psicológico

Com a proximidade da finalização do nosso processo de adoção, entendi que precisava de ajuda profissional. Pedi então o apoio da psicóloga que o acompanhava, para que, de uma forma sensível e respeitosa, ela pudesse trabalhar esse tema com ele.

A psicóloga conversou, acolheu seus sentimentos e, com muito cuidado, explicou o significado da mudança de sobrenome. Aos poucos, ele entendeu e aceitou a alteração. Mas, diferente do que muitos imaginam, o dia da nova certidão não foi um dia de festa.


Vivendo o luto pela família de origem

Meu filho não deu pulos de alegria. Ele não celebrou. Ele viveu o luto.
Na cabecinha dele, a mudança de sobrenome simbolizava um desligamento oficial daqueles que ele conhecia como família. Mesmo entendendo que agora fazia parte de outra história, havia um medo: será que isso dificultaria reencontrar seus irmãos no futuro?

A adoção é amor, mas também é perda. E respeitar o tempo e o sentimento da criança é essencial para que ela consiga construir sua nova história sem apagar suas raízes.


O que aprendi com essa experiência

Essa vivência me ensinou que, na adoção, cada criança é única e carrega sua própria história, suas dores e seus medos. O que pode ser motivo de comemoração para uns, pode ser motivo de tristeza e luto para outros.
Por isso, precisamos estar atentos, respeitar cada passo e, acima de tudo, acolher — sempre com amor e paciência.


Se você está passando por um processo de adoção ou conhece alguém que esteja, lembre-se: não existe manual perfeito. Existe o coração disposto a amar e a ouvir.

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